Minhas Prendinhas Picurruchas! Vi e Duda... |
"(...) Mas não basta pra ser livre, ser forte, aguerrido e bravo.
Povo que não tem virtude, acaba por ser escravo... (...)"
"Esqueçam idealizações imbecis ou fantasias de folcoristas. Tratarei do gaúcho em sua essência, não dos aspectos que podem simplesmente ser adquiridos externamente. Logo, ser gaúcho não é (só) vestir pilchas e dançar chula. O gaúcho é uma figura cultural, um povo, um conglomerado de características surgidas na vida no Pampa, perpassando hábitos e vestimentas e culminando em um tipo, cujas características preenchem o interior de todo gaúcho de verdade.
Um gaúcho legítimo não precisa ser nascido nos pampas argentino, uruguaio ou rio-grandense. Não precisa vestir bombachas, tomar chimarrão nem falar “tchê”. Igualmente, não é apenas engolindo água com erva-mate, dançando vaneira e cumprimentando como gaudério que um maturango vira gaúcho.
Aqui na Alemanha, há um sem-número de alemães, filhos de imigrantes turcos, que todavia agem como se nada tivessem a ver com o país onde nasceram. Não são alemães, mas também não costumam reproduzir as maneiras turcas.
Lendo uma reportagem de uma revista de turismo alemã sobre Argentina e Chile, com várias páginas dedicadas a explicar o “gaucho” argentino, senti a necessidade de escrever este texto. Substituíssemos as palavras espanholas (peón, patrón, gaucho, estancia) por portuguesas, pensaríamos tratar a matéria sobre o Rio Grande do Sul. Os valores que compartilhamos com os paisanos da Pampa castelhana estavam todos lá. A roda de chimarrão, o amor pela liberdade, a devoção ao pago, o destemor, o orgulho, a parceria com o pingo. Tudo.
É então que se percebe que a nossa pátria é o Pampa e não a praia com coqueiros; nossa característica é a bravura e não o jeitinho; nosso valor é a lisura e não a malandragem. Ver caipirinha servida em todos os bares de Berlim não desperta mais sentimento do que ouvir rumba. Já encontrar gente mateando...
O gaúcho autêntico – não importa onde tenha nascido – é um bom anfitrião, que trata seu hóspede com toda regalia; é simples de modos, mas reto de caráter; é humilde em ambições, mas exagerado em ideais e paixões; é um respeitador fiel da hierarquia funcional e o primeiro a proclamar a igualdade, quando todos sentam juntos para matear; é um batalhador, que não desiste nunca; é um rebelde, que nunca aceita ser dominado; é um bravo, que não foge de uma luta por ser difícil.
O gaúcho autêntico é um verdadeiro tradicionalista. Não porque aprende coisas no CTG, mas porque carrega em si esses valores e não vê alternativa possível de vida digna fora deles. Não é possível ser gaúcho só no fim-de-semana. Então, quem quiser falar em preservar a tradição, que comece por aderir completamente aos preceitos aí em cima. Depois, pense em pilcha, danças ou expressões típicas."
Pires, Felipe Simões, 2006. O que é ser Gaúcho. Acesso em 20.set.2011. Disponível em: http://www.artigos.com/